A estética da plurisignificação plástica

Eduardo Amaro
Mestre em Camões pela Unesp/Assis
Professor, poeta e crítico de arte
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Uma visão exclusiva do mundo e do ser humano que nele habita. Essa é a sensação que temos ao nos digladiarmos com as obras de Joe Nunes, em nosso primeiro olhar. Elas escapam do trivial e não se encaixam em uma escola única, apesar de transmitirem, por meio do Simbolismo, significações que apenas pelos olhos do espírito poderemos acessar.

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A essência dos quadros em questão e das controvertidas interpretações que neles se inserem fogem de qualquer intuito de um esclarecimento definitivo e imutável. É na plurisignificação, ou seja, no sentido múltiplo que evolui do pensamento para o pictórico, da alma do artista para a tinta na tela: o caráter do homem (ethos), as suas paixões (pathos) e o seu comportamento (práxis) representados em símbolos que libertam significações e abstrações por meio da techné (arte).
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Anarquia, neurose, perversão, fragmentação, todas essas características, patentes aos quadros de Joe Nunes, dão às obras um caráter apocalíptico, visceral. A introversão nas telas escapa de um romantismo para um simbolismo pós-moderno, ou seja, uma guerra de símbolos em um campo de batalha contemporâneo.
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Exprimem uma descoberta da alma, ou uma redescoberta por meio da arte, por meio de um conteúdo submerso no próprio “eu” do pintor, que caminha da paleta deste para aquele que observa suas obras.

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Os temas transcendentais mesclam-se com objetos modernos, em uma harmonia que suscita um estranhamento naquele que vê. Observe, por exemplo, na tela Deus ex machina. Ela resgata a essência cênica grega, tragédia e comédia, e o objeto de estranhamento é um trinco, um trinco que abre e fecha portas espirituais, por onde entram e saem os sentimentos humanos, suas angústias, paixões e desconcertos.

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Há uma espécie de metalingüística nessas obras: freqüentemente, percebemos a presença de um terceiro olho (talvez o olho da própria arte em auto-análise). Em algumas ocasiões, esse olho está representado mimeticamente, em outras, por formas circulares que nos evocam esse sentido.
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Apreciar os quadros de Joe Nunes é aprender como se concretiza a estética da plurisignificação, é olharmos para um espelho transcendental: libertamos idéias por meio de um quid pro quo com as obras de arte desse pintor radicado no Rio Grande do Sul. Um espelhamento simbólico que nos leva a uma compreensão do mundo e de nós mesmos, metaforicamente, como toda grande obra de arte deve ser.
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